Blog do Inácio Araújo

Eric Rohmer vs. Maurice Schérer

Inácio Araújo

No paraíso da cinefilia – 4

A série de documentários escolares de Eric Rohmer merece um post à parte por vários motivos.

Primeiro, porque são extraordinários. “D. Quixote de Cervantes”, por exemplo, é um elogio à imaginação todo o tempo. O Quixote não é visto como um negador da realidade, mas como aquele que abraça o real pela capacidade de fabulação.

Já “As Metamorfoses das Paisagens” começa por nos situar nas paisagens bucólicas do passado para, ao final, fazer o elogio da modernidade.

E por aí vamos. Foram mostrados dois filmes sobre literatura “Perceval ou O Conto do Graal”, que evidentemente parece um estudo ao posterior “Perceval le Galois”, do próprio Rohmer, mais “As Contemplações de Victor Hugo”. Sem falar no “Louis Lumière”, em que o cineasta entrevista Henri Langlois e Jean Renoir a propósito, claro, de cinema.

O que é mais curioso: os filmes são apresentados como sendo de Maurice Schérer, com “realização” de Eric Rohmer.

Como se sabe, Rohmer e Schérer são uma só pessoa. Schérer é o nome de batismo de Rohmer, com o qual assinou alguns artigos ali pelos 1950.

A série faz parte de um conjunto interessante, bancado por um chefe interessante do serviço (eu não guardei o nome, perdão), que apostava nos cineastas com os quais trabalhava, entre 1964 e 1969.

Para Rohmer, foi um achado. Ele se ressentia do fracasso de seu primeiro filme, “O Signo do Leão” e tinha sido afastado da direção dos Cahiers du Cinéma. Ou seja, não tinha como ganhar a vida.

Mas, a não esquecer, antes de cineasta Rohmer foi professor. Antes de Rohmer, foi Schérer. Esse o sentido da dupla assinatura, tão rara.

Jean Douchet sublinhou o fato quando comentou a série ao lembrar que durante o funeral de Rohmer, poucos meses atrás, havia uma separação entre os Schérer, a família de Rohmer, que ficavam no coro, e os Rohmer, os amigos do cinema, que ocupavam a nave da igreja.

E Douchet diz que foi amigo de Rohmer durante 60 anos sem nunca ter conhecido os Schérer, sem nunca ter sabido de seus filhos etc.

Estranho, mas muito de acordo com o homem reservado que foi Rohmer.

A série educativa teve vários outros diretores, Douchet inclusive.

É muito improvável que se encontrem ali filmes tão precisos sobre os temas que aborda, tão específicos, e ao mesmo tempo tão cheios de idéias próprias.

Promete-se para breve uma edição desses filmes restaurados em DVD. A esperar.

  1. Fernando

    14/07/2011 18:52:41

    Inácio, sou apaixonado por Rohmer. Não sabia destes documentários mas agora mal posso esperar. Tomara que saiam no Brasil já que por incrível que pareça, tem muito filme dele em catálogo por aqui. Grande abraço!

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