Um chá de Niemeyer
Inácio Araújo
A morte de Niemeyer não foi propriamente uma tragédia, mas algo que se pode definir, com precisão, como fatalidade.
É para onde vamos todos.
Uns deixam mais, outros menos. Ele deixou mais, claro.
Ocasião para jornais e telejornais se derramarem em torno do gênio nacional.
Justo, mas já começou a ficar demais.
Estão querendo fazer dele o Ruy Barbosa do traço.
Mas algo nele escapa a esse espírito celebratório.
Era um cara contra a corrente.
Comunista, para começar.
Os de bem com a vida, os comunistas de quando pegava bem ser comuna, viraram as costas a tudo, como se não fosse como eles.
Niemeyer permaneceu, com todo mundo gozando dele, da amizade com Fidel, essas coisas.
Eu acho que se não fosse assim ele seria um arquiteto convencional.
Deu tudo com os burros n’água no comunismo, tudo bem.
Mas pensar diferente, sonhar diferente é que permite fazer novo.
Tudo isso é meio evidente.
Mas o que eu vejo como legado principal de O.N. mesmo é a capacidade de ver o mundo integrado.
Ele fala dos morros, do Einstein, das curvas, da música, do povo, tudo de uma vez.
Não separa. Agrega.
Um diálogo muito interessante que ele relata, com Rodrigo de Mello Franco.
O Rodrigo M.F. diz para ele da importância de conhecer os clássicos.
Niemeyer agrega isso na hora.
Os clássicos estão inteiros nos prédios dele. Florença e tudo mais.
Kafka e tudo mais.
Isso é muito interessante, esse mundo integrado, que não despreza o exato, nem o inexato, onde a ciência e o pensamento não se desdizem, são uma coisa só.
Penso que o legado principal não tem a ver com imagem do Brasil, glória do Brasil, essas bobagens.
Tem a ver com o MEC.
Ao menos é minha impressão.