Esse Mundo que insiste em prosseguir
Inácio Araújo
Passou o 21.12.2012 e o mundo não acabou. Era a data do fim do mundo segundo um calendário maia desencavado não sei quando por não sei quem.
Há algum tempo também a profecia de Nostradamus foi para o espaço.
O mundo não vai acabar assim fácil, na boa.
Esse é um dos problemas do mundo.
Ele não acaba (nem permanece) sem propor questões.
Ou vai ser difícil.
O fim do mundo de Lars Von Trier era antes de tudo uma depressão. Seguimos e o Natal vem aí, e depois o Ano Novo.
O mundo seguirá. Também o cinema. Sei que estou meio ausente: vésperas de sair uns dias a gente trabalha muito mais.
E tem o Natal, com toda a trabalheira conexa. Outro ponto para minha plataforma de candidato à presidência: eliminar os finais de ano.
Não fica cabeça nem tempo para escrever um pouco aqui.
No entanto, com ou sem cabeça, algumas coisas me pareceram interessantes neste final de ano.
As Aventuras de Pi, de Ang Lee – me surpreeendeu aqui o uso do 3D. Ele radicaliza aquilo que o Scorsese tinha feitoem Hugo Cabret, quer dizer, a percepção de que o 3D não é um recurso realista, e sim fantástico. A sequência de naufrágio é muito forte.
As Quatro Voltas, de Michelangelo Frammartino – Essa coisa do cinema italiano tem se repetido e espero que não se torne um destino: um belo filme e depois o silêncio, o desaparecimento ou a decepção. No entanto, aqui estamos diante de imagens muito bem articuladas, calmas, conscientes. Ou talvez algumas não tenham perdido o sentido de oportunidade e improviso: aquele cachorrinho no meio da estrada, quase o prefeito da estrada, é formidável.
Infância Vigiada – Não, o nome não é esse, mas não estou com paciência para procurar o verdadeiro. É um filme argentino produzido pelo Luiz Puenzo. Então, compreensivelmente, quase aderi no começo ao Videla e asseclas, porque era umas músicas horríveis e um gosto pelo primeiríssimo plano que tornava tudo enjoativo. Como argumento, uma coisa estranha: em pleno 1979, Montoneros decidem voltar do exílio, com famílias, para combater a ditadura. Como funcionava o serviço de informações desses caras? Bem, mas isso não vem ao caso, exceto pelo fato de o personagem central ser um pré-adolescente. E o filme muda todo quando ele tem seu primeiro amor, por uma coleguinha da escola. E desde aí o filme é bem levado, com essa particularidade, o do amor numa situação ao mesmo tempo muito tensa.
Carlos Oscar
O mundo insistirá em continuar sem Carlão.
Nosso cinema ainda não sabe direito o que perdeu, inclusive porque não conhece direito o seu trabalho.
Acha que ele era um bom sujeito.
Era, mas isso era uma parte só.
É o primeiro ano em que entraremos sem Carlão, sem poder conversar, divergir, aprender com ele.
Pensam que era um maníaco cinematográfico, mas não é verdade, ou não é toda a verdade. Conhecia literatura muito bem.
Revi há dias “Filme Demência”. É uma obra-prima. Mas não é, nem de longe, a única dele.
Carlão precisa enfim ser visto. Senão nossos alunos da USP vão continuar pensando que para fazer bons filmes é preciso não saber filmar.
Para a família do Carlão meus sentimentos,
Para os amigos, a solidariedade.
Vamos para o ano que vem
(com umas folgas nos próximos dias).