Killer Joe e A Visitante Francesa
Inácio Araújo
Todo mundo já deve ter notado minha falta de paciência para falar de filmes nos últimos tempos.
Bem, com Killer Joe é diferente.
Uma volta em grande estilo do Friedkin.
E vou ficar só com o começo: um rapaz chega a uma casa-trailer debaixo de uma chuvarada, bate desesperadamente, chama por Dottie.
Não é Dottie quem abre a porta, mas sua madrasta.
A madrasta é Gina Gershon, o que inspira Friedkin a fazer um plano genial.
Ela aparece nua da cintura para baixo e se aproxima até ficar em primeiro plano.
PP da xoxota.
Quem filma isso, quem filma assim hoje em dia?
O rapaz é que se escandaliza. Pede a ela que se vista.
Ela diz algo como: Por quê? Metade da cidade já viu ela assim.
O rapaz, bem excitado, quer falar com o pai e se sente mal com a madrasta daquele jeito.
Mas fala assim mesmo. Sabe? A minha mãe tem um seguro de vida, 50 mil dólares.
Ela não vale nada. Por que não a matamos? Conheço um cara… Etc.
E depois já começa a fazer a divisão da grana toda.
Claro, é vida de pobre. É tudo aperto. E o rapaz logo aparecerá numa loja de apostas. Joga um monte no cavalo errado. Sai. Na frente dele posta-se um carro. Já sabemos pela posição frontal do tipo de ameaça que representa. O menino sai correndo que nem maluco. Pronto: há carro, há moto, há o menino correndo. Uma dessas perseguições irretocáveis do William Friedkin, cheia de um vigor único.
Pensei então que isso é que nem o Tarantino, mas de verdade.
No Tarantino a gente sente que aquilo é uma brincadeira com a imagem, quase sempre.
Com “Killer Joe” não é assim.
Claro, não se deve levar a namorada para ver esse filme.
No passado seria o que Biáfora chamava “filme para marinheiros”.
Há umas engrossadas que nem precisaria ter.
Mas é bom ver uma coisa assim. Bem rara.
Já “A Visitante Francesa” é leve, elegante, tem invenção interessante, pois coloca uma francesa na Coréia, o que significa que todo mundo fala uma língua que não a sua: o inglês.
Esse deslocamento corresponde, me parece, ao deslocamento da própria personagem, que fica ali numa espécie de fim de mundo, um balneário meio muxiruca.
E tudo sob o signo da ficção, pois a história, ou as histórias são escritas por uma garota para pagar a dívida que um parente deixou.
Bem legal, também.
No CineSesc começa os melhores do ano
Não fui à homenagem ao Carlão no CineSesc, na abertura da mostra dos Melhores, porque estava estourado. Pelo que me contaram, acho que fiz bem.
Agora, vale a pena dar uma chegada lá: toda a vida do Carlão quase está nas paredes, muito bem resumida, em fotos, em cartazes, etc.
Participei de um debate sobre Novas Tecnologias vs. Cinemas de Rua.
Se posso fazer uma crítica à organização, lá vai: só tinha velho na turma, e velho tende a ser nostálgico, a reclamar do presente.
É muito bom estar entre nós (e com o raro – em todos os sentidos – Zuenir Ventura). Mas temo que a rapaziada da platéia tenha achado que caiu por engano num encontro geriátrico.
Claro, nossas lembranças estão em outra parte. Acho que seria justo misturar um pouco, trazer gente nova para falar também.
Porque, claro, podemos reclamar do que for: as salas de rua que a gente frequentava no passado eram umas drogas.
E podemos reclamar de digital, do que for: o mundo em que vivemos é este.
O cinema também é culpa da tecnologia, no fim das contas.
E Fuller no CCBB
Mostra de respeito. Que mais dizer?