A Máfia de branco
Inácio Araújo
Vejo na TV um dirigente da classe médica.
Não sei porque, ele me faz lembrar, imediatamente, do título de um filme do Luigi Zampa aí dos anos 70: A Máfia de Branco.
Um belo título, por sinal.
O médico em questão desenvolve o pouco convincente discurso segundo o qual antes de instalar médicos em locais sem médicos o correto seria equipar decentemente os hospitais e postos de saúde.
Quanto à segunda proposição, sem dúvida, eu estaria disposto a partilhar.
Mas por que ela deve preceder a primeira? Isso não é explicado.
Um médico num lugar onde não há médicos será sempre um médico. Ao menos servirá para encaminhar o paciente para algum hospital, quando necessário.
Essa raciocínio do “antes tem que” é, por tradição, o de quem pretende mandar qualquer solução proposta para as calendas, sobretudo se ela faz sentido, sobretudo se ela corre o risco de beneficiar os pobres.
Desculpe o doutor, mas esse papo está com validade vencida.
Mais médicos? Médicos?
Como aquela não colou veio a seguinte: só nossos médicos curam.
Só nossos médicos dispõem de domínio da língua para entender nossos pacientes.
No meu entender isso é gozação. Tenho visto alguns deles fazerem as piores coisas, tanto eticamente quanto clinicamente mesmo.
Tenho uma conhecida que morreu porque, com câncer, marcavam os exames dela para dali a seis meses no SUS. Quem fazia isso eram médicos brasileiros brasileirinhos, ninguém duvide.
Ora, agora uma nova proposta, de uma associação de médicos creio que de Minas, se bem entendi.
Eles acreditam que, se o médico estrangeiro errar um diagnóstico, os nossos, nacionais, não devem corrigir o estrangeiro.
O paciente que se estoure, claro, pois ele é apenas uma peça nesse jogo de vaidades e interesses que cada vez mais se mostram absolutamente interesseiros.
Mais médicos!
Que venham os cubanos, os espanhóis, os portugueses e quem mais quiser.
Estou seguro de que vão ajudar a pobre saúde mais do que a maior parte dos nossos.
Afinal, o que eles pensam que têm de melhor que os outros?
Afinal, imaginam que só no Brasil se ensina a tratar doentes?
Não é bem isso.
O trote dos sádicos
O que é bem próprio dos nossos médicos, quando estudantes, é a prática de trotes homicidas contra os calouros que entram na faculdade.
Não tenho certeza, mas creio que foi proibida por lei.
Estranho código de ética o professado por médicos que se dispõem a deixar pacientes morrerem em nome da exclusividade de exercício da profissão no país, mesmo em locais de que eles sequer pretendem se aproximar.
Fala sério!
Se não querem ser decentes, ao menos que não sejam ridículos, não é?
A Cultura pela culatra
A propósito, o que se promete como programação nova para a TV Cultura me pareceu entre o ridículo e o lamentável.
É uma impressão e também uma desconfiança. Será preciso voltar a isso.