Mostra 37: Tsai Ming Liang e outros
Inácio Araújo
Uma coisa é absolutamente certa: entre Tsai Ming Liang e eu não existe nada em comum. Deixei “Cães Errantes” no meio, não revoltado, mas entediado.
Fui ver o filme por causa do simpático e convincente monitor da Mostra cujo nome não me lembro para quem Tsai é um “inventor”, segundo a classificação de Ezra Pound.
Já eu diria, como Macedonio Fernández: não durmo desse lado.
E, no entanto, existe algo de fascinante em alguns momentos: aqueles homens-placa no meio do trânsito, debaixo de um vento-chuva inclemente, ou o plano do homem usando toda sua força para mover seu barco.
Mas o conjunto parece se aproximar desses trabalhos meio desajeitados de artistas plásticos se aproximando do cinema. Não que Tsai não seja um cineasta, isso é óbvio que é, mas não gosto dessas coisas todas muito calculadas, desses tempos artificialmente esticados. Não são tempos mortos, são vazios. Tornam-se vazios à custa de permanecer.
E Tsai até pega fatos, coisas. Mas coloca o estilo à frente deles.
Não é o primeiro. Taiwan é o paraíso do estilismo.
Não me fazem feliz esses chinas. E a arte existe para nos fazer felizes.
Achei mais correto um rapaz perto de mim que tomava notas o tempo todo. Sim, eis aí um filme conveniente para fazer anotações: o que não falta é tempo para isso.
GriGris
Como era justo esperar, ninguém deu nada por Grigris, filme do Chade.
Como diz Alcino Leite Neto, no imaginário ocidental, a África é basicamente fornecedora de epidemias, pragas, desgraças.
Mas também tem bons filmes e bons cineastas, como esse Mahamat-Saleh Haroun. O filme é curto e grosso. Vai ao ponto: contrabando de gasolina, prostituição, esgotos a céu aberto…
O filme me fez lembrar o Simão quando diz que não vai ver filme de país que não tem água encanada.
Nem sempre.
Nesse lugar onde parece não haver emprego, lutar pela sobrevivência é o que vem na frente.
E o próprio ator que faz Grigris foi danificado na infância por uma injeção que lhe pegou o ciático e estragou uma das pernas. No entanto, esse cara virou um dançarino exímio.
Sua parceira, que na verdade é francesa e consegue como poucas unir espiritualidade e beleza física com tal intensidade.
Um filme que será subestimado em favor desses chineses.
Coutinho
Uma beleza a Mostra fazer a retrospectiva completa do Coutinho. Mas não consegui ver o que mais queria, que é O Fio da Memória, que me impressionou muito quando o vi pela primeira vez.
E também esses filmes ficcionais que ele fez e detesta, e parece que são ruins mesmo, mas eu queria ver.
E mais as coisas que eu fui vendo e esquecendo, ao menos por ora, não quer dizer que não sejam legais…