Oscar para Michelle
Inácio Araújo
O principal do Oscar, muito pessoalmente, não foi o Oscar. Foi uns dias antes, num debate na rádio. Não sei quem eram os participantes, com exceção de Evaldo Mocarzel – adivinhei pela voz. Emmanuelle Riva não fazia muito sucesso, e creio que ''Hiroshima Meu Amor'' também não. Mocarzel falava de ambos e parece que falava de extraterrestres.
''Lincoln'' era mais conhecido, mas não gozava de melhor sorte. Um dos convidados preconizava que devia ter meia-hora a menos. Que acharia ele de ''Os Irmãos Karamazov''? Em todo caso não era o mais radical. Havia um outro mais radical: podia ser um curta-metragem! E por que não? O que significa, afinal, um presidente americano, Lincoln, aliás, lutando no tempo e no espaço para abolir a escravatura? Pouca adrenalina! Muita fala! Corta tudo!
Essas coisas ditas poucos dias antes do melhor Oscar dos últimos tempos. Havia… isso e aquilo… Um Oscar como o deste ano (2012, entenda-se) não foi de filmes “feitos para o Oscar”. Eram filmes. E a maior parte deles, independente da primeira impressão inicial, minha ou não, pode ajudar a melhorar o nível do debate cinematográfico. Que fora de Tiradentes anda, pelo jeito, deprimente. Chega de deixar o pobre Evaldo em situação delicada…
O principal, claro, não foi isso. Foi Michelle Obama surgindo naquela tela lá em cima, esmagando Jack Nicholson. Se alguém pode esmagar Jack Nicholson… Michelle foi a estrela da história toda.
E o que ela nos dizia, em outras palavras? A política não é prima do espetáculo, a política não é irmã do espetáculo. A política e o espetáculo são a mesma coisa.
E “Argo”? Pintava como favorito, um desses filmes que sobem nos últimos dias e aí ninguém segura, é como eleição política, igual. Mas eu senti a sua vitória quando ganhou montagem.
Ora, a montagem de “Argo” ou é arcaica ou esconde todos os defeitos do filme. Por que a opção pela montagem paralela àla Griffithde 1912? Para criar emoção? Francamente… Talvez ficasse ruim, aparecessem certos defeitos, se montasse de outra forma. Porque do jeito que ficou o suspense fica artificial, é uma codificação muito, muito antiga… Mas ganhou montagem. Não sou especialista em “sinais” do Oscar, longe disso, mas ali me veio a sensação de que esse seria o vencedor.
Ang Lee na melhor direção? É um filme ok, me parece, se tirar o prólogo e o epílogo, absolutamente idiotas. Mas aqui é o 3D, a tecnologia, o maquinário, os efeitos… São essas as coisas postasem relevo. Depois, Ang Lee é aquele cara que não significa muito nada, não incomoda ninguém. O regra 3 ideal.
A menina que ganhou o Oscar de melhor atriz caiu na escada. No meu entender, ela não tinha estatura para ganhar. Vamos ver… Me parece que nem aquela moça que ganhou no ano em que a Fernanda Montenegro também concorreu: um Oscar especulativo, em busca de uma estrela… Mas uma estrela cai na escada? Vamos ver se levanta.
E assim fomos, de anúncio em anúncio, Giselle Bundchen mostrando como clarear os dentes a cada vez…
Eu queria ver “Lincoln”, com seu rigor, filme muito difícil, ganhar. Não vi. Queria ver Emmanuelle Riva ganhar. Isso seria um milagre. Metade daquela sala não tinha a menor idéia de quem era aquela velhota. Eu não queria ver nenhum dos atores coadjuvantes perder. Eram todos excelentes.
Em compensação, eu queria ver a Helen Hunt perder.
Gostei do Ted quando perguntou onde seria a festa depois da festa. Porque não importa quem ganhou ou quem perdeu. No Oscar importa a festa, a mobilização, a conversa fiada essas coisas. Fala-se de cinema e é o que conta.