Indústria da insignificância
Inácio Araújo
Há alguma coisa que soa falso em toda essa discussão sobre distribuidoras e agências de fomento ao audiovisual no Brasil.
Às vezes alguém fala – caso de um diretor da RioFilme na Folha, hoje – como se o mercado fosse algo estruturado e com funcionamento normal, com o público acolhendo “bons” filmes e rejeitando os “maus”, como as coisas funcionavam em 1940, Hollywood.
Falar do número de empregos também não faz sentido. Ele é ínfimo, de todo modo. Se a lógica for essa, então devemos pensar em outros tipos de indústria: petroquímica, automóveis, enfim… Não vejo o menor sentido nisso, a não ser criar isso que nos tem chegado do Rio e que é, basicamente, uma indústria da insignificância.
Dizer que concilia os filmes de grande público com produções “não comerciais” ou “experimentos de linguagem” ou que nome se prefira dar parece embromação: esses filmes saem já tremendamente pressionados e tendem a não resultar em nada.
É mais correta, e honesta, a afirmação de que não existe uma estrutura a sustentar filmes de sucesso. Que “De Pernas para o Ar 2” é um acaso… Sim, fora da Rede Globo não existe estrutura para produzir continuamente nada, nem bom, nem ruim, nem nada. O que se pode fazer são esses subprodutos.
Fora isso, só cinema publicitário. Dá muito emprego etc. A RioFilme podia investir nisso também.
De certo modo, a iniciativa paulista surge mais saudável. Ao menos não se vê o cinema como uma louca corrida em busca do sucesso fácil. (Espero também que não seja essa coisa caipira da RioFilme, de discriminar as produtoras não cariocas). Mas seria interessante parar com essa coisa hollywoodiana que a gente vê por aí, essas equipes intermináveis, e tal.
Tenho a impressão de questões de mercado têm de ser tratadas como tal. A Ancine conseguiu coisa importante, ao abrir espaço obrigatório nas TVs pagas para produção caseira. É certo, abri numa sitcom brasileira da Warner e era horrível, ridícula, mal escrita… Tinha prêmio de incentivo do MinC, não sei como. Essas podem ser as dores do parto. Vamos ver como isso caminha. Os realizadores têm que estar à altura dos espaços que se consegue abrir. Os júris também… (pois os júris atribuem prêmios a projetos de séries e tal e coisa). Se não houver talento e inteligência será muito difícil funcionar.
Temos de ter uma coisa clara: o cinema (o que chamam agora de audiovisual, ou seja, o cinema) não é uma expressão forte no Brasil. Quando se fala de música é possível falar de mercado. Se há um show do Caetano e um da Madonna a pessoa pode ir a um ou a outro, mas reconhece a ambos como do mesmo universo, embora expressões diversas, etc.
Isso ainda não acontece muito com o cinema. Então nossos filmes de sucesso serão sempre exceções felizes, do ponto de vista comercial. Aqueles que acertam na mosca por conta do tema, como Tropa de Elite, ou subprodutos, como E Aí Comeu…
Se a distribuidora paulista tiver por objetivo fazer caixa caminhará para a insignificância. Se trabalhar filmes que não se incomodam com o público, filmes de artistas, tipo “faço para mim” e o governo arranja jeito de financiar, caminhará da mesma forma para a insignificância.
Existe um caminho aberto, mas é estreito, exige um rigor enorme, não só dos responsáveis pela distribuição como dos responsáveis pelos filmes.