Um julho para não esquecer
Inácio Araújo
O que se passou? Onde estamos? Houve a retrospectiva Jacques Rivette, do Francis Vogner e do LCO Junior, a invasão do Sesc pelo Festival de Tiradentes e por fim o Hawks completo no CCSP. E ainda teremos uma retrospectiva Oscar Micheaux, também no CCBB (a partir da próxima semana), que o Thiago Stivaletti comanda.
Não me queixo de ter estado fora esse tempo todo, no entanto, porque estava em Bologna, onde fico dedicado inteiramente aos filmes, e depois conheci enfim a nova Cinemateca Francesa e seu ciclo Raffaelo Matarazzo.
(De passagem, lembro aos amigos que estarei no Centro Cultural São Paulo nos dias 24, 25 e 27 de julho, com um curso sobre Howard Hawks. É gratuito, basta se inscrever no local até o dia 20).
Mas São Paulo está excelente, e tudo aquilo que vimos como um trabalho que parecia insano, da crítica jovem na internet, agora aparece com força. Infelizmente, existe essa situação insana na Cinemateca. Os cineastas deviam estar na ponta da luta, exigindo um tratamento decente – apenas isso, decente – para a instituição.
A resposta que Marta Suplicy deu ao Ismail, quando ele foi, presidente do Conselho, a Brasília, e se é que foi essa mesmo, é inacreditável: disse que a coisa vai ficar assim mesmo até que a Corregedoria estude as contas da gestão passada e tal.
Ou seja, uma conversa fiada sob a cortina de fumaça da probidade (ah, eu detesto os puritanos e seu moralismo, isso me ensinou John Ford: o mal está inscrito em suas faces). Se fosse parar cada instituição onde há suspeita de corrupção e contas furadas… bem, o país ia parar inteiro.
Então, a única consequência disso é mesmo de dar à Cinemateca uma existência vegetativa: interromper trabalhos, dispensar pessoal que (contratado direito ou não é outra história) já tinha treinamento etc.) é um crime de lesa imagem que extrapola os limites do razoável e, mais, do perdoável.
(Leio já em algum lugar: cineastas se mobilizam para obter dinheiro – a grana, no jargão – para fazer filmes. Não movem um milímetro para defender a preservação de imagens que eles próprios já fizeram ou farão, o que é tão vergonhoso quanto o que faz a Suplicy no MinC, e talvez tão destrutivo).
Limões e Limonadas
Bem, é o que se diz: do limão fazer uma limonada.
O Conselho da Cinemateca é uma gentil reunião de gente ligada a cinema: professores, cineastas, veteranos em geral.
Ele reflete esse tipo de isolamento que o cinema conhece em relação à cultura em geral. Claro, existe no Conselho a Lygia Fagundes Telles. Mas porque ela é a viúva de Paulo Emílio. Existe Zulmira, mas não pela sua ficção, e sim por seu pertencimento ao cinema. O próprio Bresser está lá porque é um cinéfilo, não por sua importância como economista e político.
O cinema se isola, assim, a partir de seu órgão que mais intensamente reflete um elo entre prática e teoria. Não vejo escritores, nem psicanalistas (no entanto, eles promovem aproximações com o cinema e mostram-se dispostos a compreender o cinema como modo de conhecimento autônomo, não um apêndice ilustrativo de outros conhecimentos), historiadores etc.
Seria importante e oportuno o conselho se abrir neste momento de crise absoluta.