Blog do Inácio Araújo

Dezembro é o mês mais quente

Inácio Araújo

azul

1. Kechiche e Azul É a Cor…

Não é nem uma sequência, apenas um instante de “Azul É a Cor Mais Quente” que, para mim, resume suas virtudes. A jovem Adèle trocou um beijo com uma colega de colégio. Mais tarde, encontra-a no banheiro, tenta beijá-la outra vez, mas a menina recua, diz que aquilo que aconteceu foi apenas um momento e tal.

Mais tarde, quando outras garotas atacam Adèle por lesbianismo vemos essa colega recuada: não defende Adèle nem ataca. No que pensa? Na coragem da amiga, que ela não tem? No horror pelo qual deixou de passar? No que pode ter perdido? Trata-se de um personagem secundário, que desaparece depois daquilo, mas o mistério daquele instante é absurdo.

O filme é isso: uma capacidade de captar momentos de vida com facilidade, como se isso fosse de fato fácil. E de medir as pessoas a partir disso. Lembrei muito do velhinho de O Segredo do Grão, em seu esforço de tornar viável a estreia do restaurante.

São as medidas do homem – talvez ele seja mais hawksiano que John Carpenter, afinal. Mas se não for, tudo bem.

2. Os meninos da Guatemala

Não aguento muito filme com choramingação sobre nossa pobreza latina. Ela é horrível, sabe-se. Não há porque insistir sobre o assunto.

Mas a viagem dos meninos da Guatemala para os EUA não é uma questão de choro, mas de constante bravura.

Trata-se de sobreviver a condições extremamente duras: a ferrovia, o perigo, os coiotes, os ladrões, os assassinos. Para tal, contando apenas com a magra solidariedade dos colegas.

É como um bom faroeste, pelo épico, e como um bom filme sobre a Depressão (com aquele trem, aqueles despossuídos que viviam na ferrovia)

Não são só esses. Existe um filme israelense, “Alem da Fronteira”, de que gostei bem. Dezembro parece que vai compensar esse ano perdido.

3. E mais virá…

Porque “A Filha de Ninguém” é outro que não veio ao mundo a passeio.

4. Mensalão, o espetáculo: uma nova cena

Fez bem José Dirceu de renunciar ao emprego que lhe foi oferecido.

De um momento para o outro, aquele covil de ladrões que era o hotel Saint Peter voltou a ser um local plácido.

O problema não era o hotel, nem o covil de ladrões. Era, exclusivamente, o prisioneiro.

Na Folha, um leitor que se assina como juiz, compara José Dirceu e Marcola. Parece-lhe o correto: todos os presos são presos. Mas e se aproximarmos esse juiz daquele Nicolau que roubou uma fortuna? Poderemos dizer que todo juiz é juiz?

A questão com JD não é, para mim, política. Sempre foi um cara com muito cartaz com as mulheres. No meu tempo, era uma espécie de Brad Pitt das passeatas. Eu morria de inveja dele. Acho que todo mundo morria: não havia garota que não sonhasse em dormir com ele. Consegui superar o problema, mas foi custoso…

Acho que essa é a razão profunda que hoje leva a esse desejo muito mais de vingança do que de justiça em relação a ele: não é político, a política é o pretexto.

Aliás, para ser bem franco, acho que não existe a menor preocupação com justiça em tudo isso. Tanto que aquele deputado com um monte de cocaína no avião todo mundo já deixou pra lá, já virou o rosto para o outro lado (o emprego do JD).