Blog do Inácio Araújo

Arquivo : January 2012

Um beijo gay
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Inácio Araújo

Cada vez que se anuncia, no Brasil, que haverá um beijo gay na TV é aquela comoção nacional, com gente contra e a favor, discussões sobre se deve ou não deve, uma patacoada sem fim.

E o que se pode esperar do beijo gay da novela é sempre aquilo: iluminação completa, escancarada. Porque o tal beijo, aconteça ou não, será sempre um manifesto e não um gesto dramático.

Por isso mesmo ele pode acontecer ou não, tanto faz. Trata-se de saber se o bispo vai gostar e se ele tem mais influência do que o movimento gay, essas coisas. No fundo, estamos testando um pouco mais essa tremenda capacidade de invasão de privacidade que a TV reflete, demonstra e incentiva, tanto nas novelas como em programas tipo BBB.

Já o que acontece em “J. Edgar” é de outra ordem. Sabemos hoje que Hoover era homossexual e teve uma longa ligação com Clyde Tolson. Eram inseparáveis e Clyde era uma das poucas pessoas em quem o paranóico Hoover confiava inteiramente, ou quase.

Bem, era quase impossível elidir o início da relação sexual entre eles. E isso se vê no filme, mas de forma tão natural (e, no mais, discreta) que nunca pensamos no “beijo gay”. É um beijo apaixonado que marca o início daquela relação para a vida.

Há outros momentos fortes em “J. Edgar”, poucos tratando da sexualidade do personagem. Mas o momento em que, após a morte da mãe, ele coloca seu vestido é uma obra-prima, até porque não se trata de expor um travesti, mas de demonstrar a força da ligação entre Hoover e a mãe.

Um momento, mais no final, especialmente belo pela ternura é aquele em que Hoover beija um já velho Tolson na testa. É muito forte porque, embora assexuado, o beijo é carregado de sentimentos que atravessaram uma vida (isto é, duas).


Thatcher e Hoover: duas biografias
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Inácio Araújo

Nós, jornalistas, costumamos caçar erros e omissões em filmes biográficos. Mas esse aspecto é, na verdade, irrelevante.

Um biógrafo literário, para ser produtivo, deve esquadrinhar a vida do biografado. O biografado literário é uma pessoa real, ao menos vemos a coisa assim. É evidente que o autor criará uma imagem de seu biografado, mais ou menos épica, mais ou menos infame.

Na biografia filmada o que se pode criar é não a imagem final do personagem, mas “uma certa imagem”. Ele deixa de ser “pessoa real” para se tornar um personagem, objeto de manipulação daquele que cria a imagem.

Daí a diferença entre “J.Edgar” e “A Dama de Ferro”. Não importa que sejam ambos admiráveis ou odiáveis na vida real. Pode-se achar Margaret Thatcher o máximo ou o mínimo, isso não importa em termos de cinema: o problema é que sua biografia, oficial até onde isso é possível, tão preocupada em engrandecê-la (parece financiada por algum partido conservador, no mais), termina por criar uma imagem pobre, desprovida de relevo, de contradição, que apenas se torna enfadonha.

J. Edgar Hoover não é menos controverso, sabe-se. Aliás, é personagem mais grosseiro, e Clint Eastwood não deixa de vê-lo assim. No entanto, ali convivem o chantagista e o patriota; o idealista e o malfeitor. Ele é malfeitor porque precisa manter o poder, não por outra razão. Ele forja dossiês contra presidentes. Ele mantém arquivos secretos que desafiam os próprios presidentes. Ele é agente de uma ruína moral, de um esquecimento dos valores que o desespera, porque não era isso que havia imaginado ao criar o FBI.

Isso está no filme, note-se.

Ora, com Thatcher algo semelhante ocorre. Também ela despreza o tempo em que vive seus últimos anos, pautados pela vulgaridade, pelo apego à matéria, pelo desprezo das idéias. No entanto, ela tem muito a ver com a construção desse mundo, da qual é uma agente privilegiada, malgrado ela. O problema é que isso nunca está no filme. O mal do mundo ocorre à revelia dela e apesar dela.

O sombrio Hoover é, visto por Clint Eastwood, uma personalidade fascinante. A combativa Thatcher é, vista por não importa quem, algo como uma estátua eqüestre.


Tintim por Tintim
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Inácio Araújo

Spielberg gostava de Tintim. Reservou os direitos para filmagem ainda nos anos 1980. Hergé gostava de Spielberg, pelo que li, e adorava “Encurralado”.

O resultado é que o primeiro exemplar de “As Aventuras de Tintim” é bastante fiel ao personagem, aos seus comparsas (Milu, sobretudo, mas também os investigadores idiotas, Dupont e Dupond, e mesmo o capitão Haddock).

Ele se preserva de certas besteiras, como a atualização das histórias, por exemplo. E, sendo uma história européia, acentua um lado meio britânico em vez de pender para o americano.

No mais, Tintim continua a ser um herói adolescente, ou seja, algo bem a caráter para Spielberg: há nele essa vitalidade que SS gosta de ver em seus heróis. E a trama cheia de reviravoltas também é à caráter para o cineasta, não precisou trair o original para fazer um filme com bastante ação.

O que li de mais interessante sobre a transposição foi numa entrevista com Benoît Peeters, um especialista em Hergé, publicada pelos “Cahiers”.

Ele entende que o estilo de Hergé lembra o melhor do classicismo, pela economia das linhas, pela clareza do traçado. Nisso, o filme se distingue bastante, porque o estilo de Spielberg supõe uma sobrecarga de movimentos que ele aproxima do barroco.

Há outras sobrecargas importantes. Peeters vê no processo “motion capture” (filma-se o ator sobre o qual é criada a imagem digitalizada), assim como na direção de arte, um efeito hiperrealista, o que de fato acontece.

Isso é mostrado claramente como opção de imagem logo no início, quando um artista desenha o nosso herói e, no desenho, vemos exatamente o Tintim de Hergé, mais leve, de linhas simples e claras.

Se essa opção é compreensível, a da movimentação muito grande da câmera não me parece se justificar tanto. É verdade que vi o filme na sala Imax e com legendas. O 3D me parece que funciona melhor dublado.

Mas se lembro de “Avatar”, digamos, existe uma suavidade maior nos movimentos, enquanto em Spielberg, barroco ou não, há algum desconforto para a vista. Não sei como a garotada reage a esse tipo de imagem, mas ainda sinto certo desconforto com o 3D quando vem muito agitado, e mais ainda em filmes longos, como este.

“As Aventuras de Tintim” lembra em vários aspectos os filmes de Indiana Jones. Há, inclusive, esse partido da ação muito cerrada, com reviravoltas contínuas etc. É bem o espírito do Spielberg juvenil, de aventura contínua, que não desmente o original.

No entanto, eu gostaria de ver no filme um tanto mais um personagem muito interessante que aparece no início, é referido mais tarde e depois esquecido: o velhinho batedor de carteira. Num filme em que tirar um pedaço de papel da mão dos outros é tão fundamental, penso que ele poderia ter um papel interessante e acrescentar um humor que falta ao final, agitado demais.

Uma outra coisa: não me entendo muito bem, ao menos por enquanto, com essa nova geração dos “Cahiers”. Mas algo que o crítico que escreveu sobre o filme, Jean-Sébastien Chauvin, é interessante. Ele diz que o fundamento de Tintim é uma vida sem destino, sem parada. Ele identifica no herói spielberguiano a ação como saída para a impotência de sua própria condição. Isso o leva a agir. Tintim seria assim. É um ponto de vista digno de reflexão, me parece.


Serão os games uma arte do futuro?
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Inácio Araújo

Esse novo sistema de blog dificulta a entrada para comentários e tal. Acho que dificulta. Eu, em todo caso, não consigo entrar.

Mas, voltando de férias, dou uma lida nos comentários todos. Alguns vão sendo naturalmente respondidos, à medida que vou escrevendo novos posts. Os do pessoal dos games, no entanto, talvez mereçam uma reflexão à parte.

No post anterior dizia que me parecia meio chutada a opinião de um cara para quem só falta um Chaplin para os games serem vistos como arte.

A minha opinião também é meio chutada, já vou avisando. Não vejo games desde que meus filhos desencanaram deles e não vou julgar o trabalho de ninguém, mesmo porque é uma categoria toda à parte.

Minha dúvida toda na história é se a arte pode ser uma coisa interativa como os games.

Não é com os games a minha encrenca, mas com essa idéia de que a interação vai salvar o mundo, ou a arte, ou o que quer que seja.

Eu sou um pouco antiquado nessas coisas. Os mobiles vieram, viraram moda, mas os mobiles não marcaram porque eram mobiles, nem porque eu podia encostar neles, mas porque seus autores originais eram inventivos.

Por isso falei dos bichos da Lygia Clark: hoje em dia ficam expostos numa redoma, a dois metros da gente, ninguém chega perto. Mas não perderam a importância por isso.

Enfim, alguém pergunta “o que é arte”. Não sou eu que vou limitar o que seja ou não arte. O mundo definirá isso, e não posso ter posição fechada a respeito de algo que desconheço.

Só penso que essa história de interação, de livro com cinco finais, essas coisas supostamente democráticas, uma bobagem.

Sobre o que é arte vou dar a resposta que uma vez o Borges deu: “arte é o que nos dá felicidade”. Mas nem tudo que dá felicidade é arte, claro.


La China È Vicina – cap. 2
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Inácio Araújo

Tomo de empréstimo o título do célebre (justamente célebre, é bom dizer) filme de Marco Bellocchio, mas o resto tem mais a ver com Hu Jintao, o que ele chama de programas de entretenimento e influência Ocidental na China e, por fim, o canal chinês que está sendo lançado em Nova York e, esperemos, logo chegue por aqui.

Primeiro: se a China é o segundo país do mundo, em riqueza e mais um monte de coisas, é desejável que a gente receba imagens de lá. Quer dizer, espero que elas cheguem logo por aqui, assim como gostaria de ver um canal argentino ou venezuelano. Pessoalmente, não agüento mais fazer zapping e ver todo o tempo a mesma coisa, os mesmos filmes, os mesmos EUA. Mas tenho a impressão de que do ponto de vista cultural isso é uma desgraça.

Por falar em desgraça, Hu Jintao está criando, com sua hostilidade à presença ocidental na China, a mais recente versão da “cultura socialista”. Como se sabe, cada vez que se tentou acrescentar um adjetivo à palavra cultura chegamos a um par de botas. Certamente Dante Alighieri não sabia que estava pondo fim ao medievo, quando escrevia. Apenas escrevia. Se alguém dissesse que era preciso substituir a “cultura medieval” pela “cultura renascentista” me parece provável que ela já nasceria acadêmica.

Mas Hu Jintao e eu temos algo em comum, que é considerar a maior parte dos programas de entretenimento da TV uma emanação do inferno. Não é que o Ocidente queira destruir a China, talvez seja, antes, um movimento autodestrutivo.

Mas o que Hu Jintao tem a oferecer em troca? Sabemos que a censura feroz vigora na China. É isso que virá no lugar dos shows? Um show da censura? Não seria má idéia, com aqueles caras vestidos iguais explicando porque tal e tal coisa prejudicam a nação chinesa. Ou aqueles discursos de dirigente comunista? (Ah, não, Hu, você está falando com um cara que já tentou ler os discursos sublimes de Enver Hocha – não lembro se se grafa assim – o sublime condutor da Albânia. Francamente, não dá pé).

O que seria um entretenimento que a China poderia nos oferecer? Talvez algo que viesse não do Partido ou similares, mas de sua população. Livremente. Mas, claro, seria pedir demais.

Aqui no Brasil isso seria possível, se em algum momento os canais tivessem algum interesse em elevar a população. Mas parece que seu objetivo é imbecilizá-lo (mais do que já faz o sistema educacional).

Hollywood é outra que não parece disposta a contribuir para a civilização chegar a alguma parte. Então, vamos resumir: a única coisa relevante disso tudo, além do surto de “cultura nacional” substituindo a “cultura socialista” é que o camarada Hu Jintao tem razão em acreditar que é necessário um contra-ataque. Mas não vejo com o que ele poderia contra-atacar. Há uns bons cineastas por lá, servem para uso externo, mas não estou seguro de que veiculem a imagem que Hu pretende difundir.

Daquelas óperas insuportáveis do tempo da Revolução Cultural nem ele quererá lembrar. O que vai, então?

A cultura sempre foi o calcanhar de Aquiles dos países socialistas, muito antes que todo o resto se mostrasse tão claramente putrefato quanto se mostrou. A China, com progresso e tudo, não se sabe no que vai dar. O camarada tem razão de pensar que não há país dominante sem cultura própria (ou, no caso, invadido pelo Ocidente). Mas que cultura se produzirá para o mundo num país meio comunista, meio ditatorial, meio capitalista? A China é (ainda? de novo?) um enigma. Mas, com toda franqueza, não acredito que dessa mistura algo de muito interessante venha a se revelar a nós.

Ainda assim, quero ver o canal chinês.


Imagem é tudo
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Inácio Araújo

“A Tomada do Poder por Luís 14”, que tem no Brasil um nome meio estrambótico e de que eu não me lembro (em todo caso, saiu numa boa cópia pela Versátil), é talvez o grande filme político do século passado, justamente por mostrar o processo que leva um rei jovem e quase desprotegido (por causa da morte de seu conselheiro, Mazzarino) a controlar uma nobreza cheia de ambições.

O que acontece em “Tudo pelo Poder”, o novo filme de George Clooney é mais cheio de reviravoltas, claro, já que se trata de um thriller político, mas expõe de certa forma esse princípio: mesmo numa campanha política há que tomar o poder quem quiser ter algum poder.

Me pareceu um filme guiado pela palavra, o que não significa que a imagem seja desimportante. É que a imagem segue a palavra, e não o inverso. O filme já começa com o ensaio de um discurso (o assessor de imprensa da campanha fala o mesmo que o candidato deve falar mais tarde).

Depois, esse mesmo assessor manterá, incauto, uma conversa com o chefe de campanha do candidato adversário, o que o coloca em sérias dificuldades. Por fim, toda a chave da intriga se baseará em ligações telefônicas dadas ou recebidas por um certo celular.

O que é interessante e faz ver em Clooney um cineasta que se destaca bem no panorama americano atual é a percepção que temos, no início e no final, de uma campanha do Partido Democrático nos EUA. Isso supondo, claro, que o Republicano é aquela baixaria.

Os democratas, ao contrário, são dignos, e ninguém poderia ser mais digno do que o próprio Clooney como candidato em disputa das primárias.

No entanto, ao sair, nossa percepção sobre o processo político mudou substancialmente: é uma coisa suja, indigna. E o próprio candidato toma decisões que o apequenarão substancialmente.

Estou falando pouco para não atrapalhar o prazer de quem ainda não viu o filme, naturalmente.

O fato é que a transformação se faz suavemente, quase sem que a gente sinta, como se a expressão de Clooney só mudasse como reflexo da mudança que atinge o rosto de seu assessor de imprensa.

Temos o costume de achar a política uma coisa suja, sentimento que a visão desse filme pode eventualmente reforçar. O fato, no entanto, é que as coisas que se passam lá dentro, na campanha, não são em nada diferentes, como substância, daquelas que se dão em empresas e até em nossas casas.

A diferença substancial é que políticos precisam a todo custo preservar uma imagem, pois é isso que vendem. E Clooney sabe manter todo o tempo, como candidato, a expressão cândida de garoto-propaganda da Nespresso. Mas o mundo, que fazer?, de cândido não tem nada.


Móbiles (e outras coisas)
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Inácio Araújo

Não conheço nada menos interativo do que, digamos, os bichos de Lygia Clark. Eles estão lá, parados, e nós em geral colocados a uma distância colossal, em estado de respeito e reverência. Nem se deixassem a gente tocaria.

Por essas e por outras tenho sérias dúvidas de que nascerá um Chaplin dos games, como quer um cara que deu entrevista na Ilustríssima outro dia.

É certo que o cinema já perdeu o papel de centralidade que herdara do romance do século 19 na constituição dos costumes e hábitos culturais. E parte disso se deve ao fato de que para muitos da garotada essa arte parece uma chatice por ter uma via só.

De fato, os games podem ser mais interessantes para esses. Mas daí a constituirem uma arte vai certa distância que eu não imagino como poderia ser percorrida.

Talvez não seja uma arte o que herdará o papel do cinema. Pode ser, e aí a interação conta, a hipótese de se trabalhar a montagem a partir dos vários universos propostos pelas estações de TV (juntar um fragmento da MTV com outro da Globo e daí ao Datena etc.). Isso pode sugerir um tipo de arte mais ou menos como o móbile, que alguém fará como arte e depois as pessoas podem imitar em casa, etc.

Pode ser que a moda ocupe esse lugar, ou uma arte a surgir, não se sabe. Dizer que são os games, não sei, me parece apenas um palpite.

Morte aos gatos

Numa medida saneadora, um juiz federal decretou que todos os aparelhos usados para tapear as codificações dos sistemas de canais por assinatura estão proibidos. Não só a importação como a venda.

Os usuários desses aparelhos também estão devidamente criminalizados. Segundo a notícia, o prejuízo das operadoras era de R$ 100 milhões por mês.

Muito bem: é a lei e a ordem atingindo não só as favelas, mas também a Net, a Telefônica e sei mais eu quem que faça esse tipo de operação.

Porque agora acabou a desculpa do prejuízo por conta dos gatos. E, supostamente, esses milhões todos serão empregados em diminuir as mensalidades extorsivas que cobram daqueles outros que não usam os tais gatos.

A ver. E esperar.

A esperar

2011 chega ao final. Continuamos à espera do prometido retorno da coleção Aplauso, da Imprensa Oficial paulista. Prometida meio às pressas, é verdade, no improviso, quando o diretor da empresa era prensado devidamente sobre o assunto, na coletiva de imprensa da 35ª. Mostra.

Mas esperamos do mesmo jeito. Ou antes, com um pouco mais de atenção. Porque edições milionárias e/ou para puxar o saco de políticos estão saindo bem saídas.

Bandos bancários

Há gerências de um banco, do Brasil, que, segundo me disseram, adotam o seguinte procedimento: quando a conta bancária está sem uso há alguns meses eles mandam um extrato anunciando que a conta “está desativada”.

Meses (ou mais de ano no caso de que me falaram) eles mandam um outro aviso, agora por telefone, dizendo que o fulano está com um buraco na conta de não sei quantos reais, devido a despesas de não sei bem o quê (de nada, a rigor, já que nesse tempo todo não mandam nem um mísero extrato).

O mesmo banco já me aprontou coisas do tipo, mas não nessa escala (ficou meses sem mandar extrato da conta que eu não usava e depois mandou um cobrando uma bela nota. A pergunta é: por que não mandam logo? Por que não avisam do risco que se corre?)

Alguém conhece histórias semelhantes? Esse tipo de procedimento é legal ou é aplique?

2012

Humberto Saccomandi, que é do jornal Valor, portanto saca dessa área de economia (saca de cinema também, mas isso é outra história), avisa que o ano que vem será duro do ponto de vista econômico.

Espera-se a Europa devagar, e isso afetando o pessoal que vai mais ou menos, ou seja, respingando legal na gente.

Ainda assim, fica o desejo de que a previsão seja pessimista e que o mundo ao menos entre um pouco nos eixos. Para o bem de todos. E também dos amigos.


Kid Kennedy vs. Roda Viva
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Inácio Araújo

Enquanto Roda Vida, na Cultura, sintonizava-se com o lançamento de um livro e com a própria TV (não pública) e entrevistava Boni, ex-diretor da Globo, Kennedy Alencar dedicava seu programa, na Rede TV! (comercial) a divulgar o pouco conhecido deputado Marcelo Freixo, do PSOL do Rio.

Na verdade, nós aqui, fora do Rio, só sabemos de Freixo porque inspirou um personagem de “Tropa de Elite 2” e porque teve de sair por um tempo do Brasil, enquanto esperava ter proteção adequada.

Compreende-se que ele seja tão ameaçado. De repente chega um cara nada dogmático (ao menos nas questões de segurança) e diz que milícias são muito mais perigosas do que esses traficantes de chinelo de dedo apresentados como grande ameaça nacional.

No programa (que pode ser assistido em três partes aqui), ele explica direito por quê. No que é ajudado pelo entrevistador, sóbrio e eficiente. A milícia é no mínimo um caminho para a organização mafiosa. Tem poder político e de corrupção. Os traficantes são pouco mais que pobres coitados. As milícias ainda não foram atacadas no Rio (pode ser estratégico, mas isso é outra história).

Enfim, o cara é interessante do começo ao fim e combativo idem. E íntegro. Não é “divertissement”. O que talvez explique o completo (repito: completo), ensurdecedor silêncio da mídia a seu respeito.

Enquanto isso, na TV pública ouvimos amenidades sobre a TV. Não é que se deva ter sempre programas graves sobre coisas terríveis, mas é que na última segunda-feira o contraste ficou um tanto escandaloso.


2011 – Um Ano de Seca
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Inácio Araújo

Talvez o prenúncio estivesse já no começo do ano, quando o Oscar indicou dez filmes quase todos intragáveis. Mas o que veio depois não foi tão melhor assim.

De maneira que na lista de Dez Mais que fiz para o Uol entrava, felizmente, “Tetro”, que estreou ainda em 2010. Mal cheguei aos dez, ainda assim.

Eis aqui quem eu preferi, com um pequeno comentário:

1. Cópia Fiel, de Abbas Kiarostami – mais uma afirmação forte de que não somos um, somos múltiplos, cópia e original, duplicações, maridos e ex-maridos, bandidos e mocinhos.

2. Singularidades de uma Rapariga Loira, de Manoel de Oliveira – porque Oliveira abole o tempo, traz o presente ao passado e vice-versa e depois rompe com os dois, se preciso.

3. Tetro, de Francis F. Coppola

4. A Árvore da Vida, de (esqueci quem) – ambos carregam a dor de ser pai e a de ser filho; a dor inevitável.

5. A Pele que Habito,. de Almodóvar – talvez o nome diga tudo: a pele é um habitáculo.

6. Melancolia, de Lars von Trier – o fim do mundo em cada um

7. O Garoto da Bicicleta – porque as cores que eles usam, os contrastes, são fortes.

8. Isto Não É um Filme, de Jafar Panahi – porque era o único filme possível, o único verdadeiro.

9. Rio – uma boa animação.

10. O Palhaço – com altos e baixos, mas me pareceu ter uma energia muito interessante.

Quem quiser brincar de lista manda ver.


Uma bela estréia: Margin Call – O Dia Antes do Fim
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Inácio Araújo

“Margin Call – O Dia Antes do Fim” certamente não muda a história do cinema. Mas: a) é um primeiro filme; b) o diretor e o roteirista são a mesma pessoa.

Começamos, então, com dois bons sinais: neste mar de filmes impessoais a que Hollywood nos acostumou eis aqui um pouco de pessoalidade, de alguém que chega dizendo: tenho algo a dizer.

E tem mesmo. Se a gente comparar o filme de J.C. Chandor com, digamos, o “Wall Street” mais recente de Oliver Stone, ou mesmo o mais antigo, que é mais interessante, fica fácil observar a diferença.

O filme trata de Wall Street. De um grande banco (ou algo assim) que, a horas tantas, descobre´que, de tanto se expor a riscos, está para quebrar. Diz-se que é inspirado na história do Lehman Brothers, mas francamente isso não tem importância.

O que me chamou mais a atenção é que, por uma vez, os seres de Wall Street não são tratados como vilões absolutos fanáticos por dinheiro, dinheiro pelo dinheiro etc. Nisso a coisa é o inverso de Oliver Stone, que em linhas gerais responsabiliza a ganância por todos os males da Terra.

Chandor é mais sutil. A ganância até existe, mas mais do que tudo existe, do ponto de vista subjetivo, necessidade de afirmação das pessoas, seja pelo ganho em si, seja pelo lugar que ocupa na instituição e na sociedade.

Mas é mais uma questão objetiva que norteia o filme: a existência de uma engrenagem voltada à sobrevivência (das instituições, antes de mais nada, e até mesmo contra as pessoas, se necessário). E as instituições financeiras movem-se preferencialmente pelo medo. O pânico fica por nossa conta, nós, os otários, quero dizer.

O filme se passa quase inteiro no edifício do banco. No fundo é como se o mundo exterior não existisse fora daqueles números, papéis e cálculos. No entanto, a engrenagem funciona como um trator, meio incontrolável, e é nessa medida (o ignorar o mundo e o trator) que podemos ver, de tempos em tempos, os personagens dizendo que não têm escolha. Nunca têm escolha – eles se vitimizam, é claro: montam nos bônus colossais, mas dizem não ter opção. Mas isso em parte é verdade, desde que adotemos o ponto de vista deles (isto é, dos seres envolvidos na coisa, não do “mercado”).

É verdade que estamos em Hollywood, portanto é preciso que haja algum vilão. Vilã, no caso: Demi Moore, a srta. Robertson, que demite Stanley Tucci logo na primeira sequência (esse só se ferra, impressionante).

Mas quando os dois se encontram, numa sala, sozinhos (não direi em que circunstância), como que encarcerados, ambos concluem, o lobo e a ovelha, que não têm opção.

Então, à obrigação de criar um vilão, Chandor responde relativizando isso ao extremo. Não há vilões, não há heróis. Não são santinhos, nem de longe, são classe alta ou pretendem chegar lá, dão importância a isso e tudo mais. Mas não serem maus em si enfatiza o fato de haver uma nocividade que está além das pessoas. Estamos mais perto, então, de entender como funciona um sistema, em vez de ficar apontando o dedo para um ou outro “bad man”, ou “culpado” ou algo assim.

Por fim, temos ali um belo elenco, puxado por Kevin Spacey.

E o Jeremy Irons, que é outro gênio, anda numa preguiça infernal: adotou esse tipo de inglês safado e cínico e sobrevive com ele na boa: serve para ser o papa Bórgia ou o papa dos mercados de Nova York.

Duas observações

A primeira é que eu sou um primitivo em termos de internet, não sei nem como responder às intervenções aqui no blog. Mas eu as leio e levo em consideração.

A segunda é que às vezes fico um pouco fora, por diversos motivos: excesso de trabalho, doença, eventual viagem ou, até mesmo, falta do que dizer.

Porque não existe nada pior do que a necessidade de dizer algo quando a gente não tem nada a dizer.

Então, não que eu não me sinta comovido quando alguém pede para eu voltar. Ainda bem. Mas quando eu estiver meio de fora haverá as intervenções do Juliano Tosi, que é muitíssimo talentoso e capaz, e em quem confio inteiramente.