Um fillme começa quando eu entro…
Inácio Araújo
Uma experiência que não se pode ter mais é a de entrar no meio dos filmes.
As bilheterias são informatizadas, de maneira que o computador impede a venda de ingressos a partir do momento em que começa o filme principal. Para mim, perde-se em prazer. E também em saber.
Como dizia o Jairo Ferreira: o filme começa quando eu entro e termina quando eu saio. O que significa dizer que cada um de nós monta sua fábula conforme seu olhar, mas também durante o tempo em que permanece lá dentro.
Quando eu entrava no meio dos filmes, como não sabia o que tinha acontecido, na verdade iam se passando dois filmes. Um se desenrolava a partir da minha entrada na sala. O outro, ia de trás para frente, construído na imaginação a partir dos dados que os personagens agora nos forneciam.
A história nunca ficava completa, fechada. Quase sempre surgia um elemento para perturbar a ordem do que havia sido contado e a compreensão do início, da parte perdida.
Depois, costumava-se (se o filme não fosse vagabundo) ficar para ver o começo de novo. E, surpresa, normalmente aquilo que eu (mas creio que não só eu) imaginava mostrava-se muito mais rico, cheio de detalhes e aventuras do que o que realmente se passara na tela.
Não quer dizer que a imaginação do espectador fosse melhor do que o filme. Cada um tinha sua função. A da nossa fabulação de espectadores consistia em imaginar o maior número de hipóteses possível.
Estranho Encontro
Outro dia isso aconteceu na TV, na TV Justiça para ser mais preciso, em algo chamado Sessão Cinemateca.
É claro, devem ser filmes vindos da Cinemateca. Mas ela não faz alarde a respeito: tudo que diz respeito a difusão do cinema parece embaraçar nossa velha instituição.
O certo é que corria na tela um filme brasileiro, claramente anos 50. Eu sabia que era brasileiro porque essa é uma sessão de filmes brasileiros. E também porque se falava em português sincronizado, não dublado.
Mas havia uma loura com cara de atriz estrangeira, num carro. Uma loira apavorada que lembrava a Janet Leigh, mas não era. Quem seria essa atriz que nunca vi em parte alguma?
Ela tem um diálogo estranho com o homem que dirige o carro, e que não distingo quem seja. Sei que ele ameaça uma espécie de duplo suicídio no carro mesmo.
Por fim, o carro pára e a loira desce. Não se vê o homem que desce pouco depois, apenas que ele segura um bastão para ajudá-lo a caminhar.
Todo o clima é de um filme noir. Não de um arremedo de filme noir. Seria um filme da Maristela?
O homem com a bengala é uma pista: onde vi isso antes? Seria uma lembrança de “Gilda”?
O cenário seguinte elimina a idéia de Maristela: o quarto é muito amplo, a decoração chique demais. Tem cheiro de Vera Cruz. Mas uma classe que a Vera Cruz não tinha. Não é luz da Vera Cruz.
Aí aparece Sergio Hingst. Então a hipótese Vera Cruz existe, mas apenas como lugar físico. Pela época, o filme é mais Brasil Filmes. Mas não “Ravina”, com certeza.
Quem poderia fazer um filme na Brasil Filmes com tamanha classe? Anselmo Duarte poderia, mas não era filme dele.
Então era filme do Walter Hugo Khouri, só podia ser.
Observando melhor, essa luz leve, delicada, precisa, só podia ser de Rudolf Icsey.
Então era filme do Khouri. E eu entendia porque Glauber fez tanta questão de vir a São Paulo mostrar seu primeiro filme a ele. Decupava como pouca gente. Controlava a imagem perfeitamente.
O que vem a seguir: o homem da bengala aparece. É Luigi Picchi. Então fica claro que o filme é “Estranho Encontro”, que eu não via há tanto tempo. Pelo que vi, continua ótimo.
Quase não lembrava da intriga, o que me permitiu aproveitar melhor certas fusões, certas associações de imagens que o filme traz. Depois foi só esperar o momento principal: aquele em que a loira levanta o vidro do carro e, no reflexo, terrível, podemos ver, ao mesmo tempo que ela, a imagem de Luigi Picchi.
Foi um bom, agradável exercício de retorno ao tempo em que se entrava no meio dos filmes. De passagem, pude rever uma boa parte desse filme admirável, que não via há tanto tempo e que é, me parece, talvez o melhor de Khouri.
Em tempo: vi no Imdb que a atriz se chama Andrea (ou Andréia) Bayard. Não me lembro dela em nenhum outro filme.
Em tempo 2: a Tv Justiça irá reexibir ''Estranho Encontro'' neste domingo, às 18h30.
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Chrystal Ksiazek
18/07/2011 19:49:31
I’ve been wondering about the similar factor myself lately. Delighted to see an individual on the same wavelength! Nice article.
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Christina Carabini
05/07/2011 10:59:55
O .mais famoso O cangaceiro de Lima Barreto 1953 ganhou premio em .Cannes como melhor filme de aventura ..Foi nesse periodo da historia que uma critica de .cinema surgiu principalmente na Franca analisando criteriosamente .o que estava sendo produzido e construindo teorias sobre tecnica .linguagem e estilo. Autor fixador do comportamento do povo brasileiro .que dialogava com a maneira de falar social VIANY 1999 mas que .localizava seu sentimento de pertencimento em territorio americano..2.O primeiro cinema brasileiro a venda do nacionalismo.O cangaceiro estava destinado ao sucesso no .valor da moeda custou a fortuna de dez milhoes de cruzeiros hoje .orcamento minimo para um filme..Glauber Rocha ROCHA 2003 .O estudio da Vera Cruz criado no final da decada de .40 do seculo passado fora uma tentativa comercial de concorrencia .com a industria do cinema mundial.
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nane
15/06/2011 21:43:01
Muito obrigado Marcelo pela explicação, valeu, agora posso procurar o filme pelo nome correto, abraços!
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Marcelo
13/06/2011 23:13:45
Nane, o filme é "O Grande Momento", do Roberto Santos. O primeiro nome do Guarnieri, que era italiano, é Gianfrancesco.
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Marcos Anton Nogelli
13/06/2011 00:16:07
Poxa, se tem um hábito que sempre rejeitei na cinefilia mais velha que eu (tenho 39 anos) é esse do entrar no filme no meio dele. Tenho vários amigos e amigas de 40, 50 anos para cima que falam com saudade deste hábito. Acho ele um equívoco completo.Quanto à Bayard, o destino dela não pode ser descoberto naqueles blogs sobre cinema brasileiro, alguns deles espeacializados nas mulheres (atrizes e técnicas) que fizeram a Hstória de nossa cinematografia?
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hugo
12/06/2011 20:06:14
No IMDB não tem a lista de filmes dos quais essa atriz participou?
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nane
11/06/2011 19:32:13
Adoro filmes antigos! Assisti há tempos atrás, um filme chamado "A grande chance" (será?) com Paulo Goulart, Jean Francesco Guarnieri, sei lá quem +, adorei, é sobre o dia do casamento de um rapaz classe média baixa, uma festa com cara de festinha no quintal...foi excelente, não sei se vc viu. Infelizmente acabei de chegar, fui assistir "Qualquer gato viralata..." e ri muito, mas não dará para ver o filme que vc recomendou, e que deve ser ótimo. Bom domingo, abraços!
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