A TV sem imagens
Inácio Araújo
Sintonizo no rádio (na rádio Estadão/ESPN) um programa que conheço da TV, o “Sportscenter”.
Minha primeira reação é imaginar que se trata de um correlato, isto é, algo com o mesmo objetivo (resenha de acontecimentos esportivos do dia) e mesmo nome, mas feito para o rádio.
Não custo a notar que, afinal, aquele programa e o da TV poderiam ser quase idênticos. Há a voz do locutor, a do comentarista, ou a de um repórter e de seu entrevistado. Momentos de música.
Percebo, por fim, que se trata do mesmíssimo programa.
É curioso o papel jogado pela música: no rádio ela é uma espécie de respiro, de “silêncio das palavras” abundantemente usadas, enquanto na TV elas ilustram imagens.
Tudo é muito rápido: a música não dura mais do que alguns segundos, senão o programa seria musical, é óbvio.
O que eu quero notar é que, basicamente, a TV brasileira, em muitos momentos, ainda é inteiramente dependente do rádio. Com algumas pequenas mudanças seria possível passar uma novela ou um noticiário no rádio, pois a base de tudo são as palavras.
As imagens são o supérfluo da TV, a ilustração.
Graça e grosso
Vi muito poucas vezes e por poucos segundos o “CQC” da Bandeirantes, que me afugenta de imediato por causa do ruído muito alto.
Mas não me espanta a revolta de Ronaldo, o ex-jogador, o Fenômeno, com vulgaridades ditas a respeito de uma conhecida.
Me espanta que essas vulgaridades, ditas a todo instante nos programas de humor “jovem” (isto é, este e aquele outro, cretiníssimo, da Rede TV!), sejam normalmente assimiladas como coisas normais.
Existe um absoluto desconhecimento do limite entre a graça e o grosso, entre achado e vulgaridade. Pode ler ou ouvir o Simão, por exemplo: ele corteja a grosseria, mas nunca a invade.
Ok, eu e o Simão somos velhos. Mas o Ronaldo F. não é. E quando a coisa se virou para o lado da amiga dele, chiou. E diz que aí a direção da Bandeirantes chamou a atenção do cara.
Mas, caramba, até então eles não tinham notado nada?
CQC
Mas é tudo um pouco esquizofrênico, é preciso notar.
Um dos rapazes do CQC fez, há não muito tempo, um programa magnífico com um usuário de crack. Coisa relevante.
Som de vanguarda?
A única coisa que conta na TV é audiência. Acho que o mesmo rapaz se interessa muito mais por fazer programas como esse sobre o crack do que por ficar naquela barulheira.
E há o apresentador central, que um dia foi o mais que interessante Repórter Varela. A mim, em todo caso, interessava muito mais o que fazia então.
Os programas de humor “jovem” não me parecem herdeiros nem do rádio, nem da revista, nem de parte alguma. Não têm imagem e o som é inaudível.
Em todo caso, eu gostaria de um dia gravar a banda de som de um deles e só escutar. Será, talvez, uma sonoridade de vanguarda?