Renato Russo ou a volta por cima de Fontoura
Inácio Araújo
Biblioteca Aberta na Cinemateca
O pessoal da Cinemateca avisa que eu me enganei quadradamente ao afirmar, outro dia, que a Biblioteca da instituição estaria fechada.
Não está. Apenas está fechada nos finais de semana.
Durante a semana está funcionando normalmente.
Espero que, com essa mancada, não tenha prejudicado ninguém.
Somos Jovens Nós os Velhos?
O Fontoura, vejo pelo IMDb, está com mais de 70 anos.
No entanto, seu “Somos Tão Jovens” tem um vigor que não vejo na maior parte dos filmes das gerações pós-Embrafilme.
No começo do filme, quando o Renato Russo sai para o exterior, não me lembro se ao sair do hospital, mas é bem no começo, há um quase primeiro plano com câmera na mão trepidante.
Dá a impressão de que o cara do steadycam não veio naquele dia.
Eu me senti meio mal no cinema.
Mas em seguida refiz o percurso: Pode ser que não seja muito bom, mas pelo menos eu não estou naqueles filmes em que tudo é certinho, tudo é correto, engomadinho…
E o Fontoura estava certo. O filme foge disso. Não sofre de obsessão fotográfica. Não sofre pela necessidade de um roteiro certinho…
Aos poucos foi se impondo uma coisa meio raivosa, inquieta, inconformista. É por esse lado que o filme vai ver aquela geração e o rock Brasília e o RR em particular. E pelo lado de uma garotada a rigor privilegiada, mas que sentia a sufocação da ditadura e de algum modo sente que precisa se expressar.
No fundo, estamos no Fontoura do “Rainha Diaba”… Talvez não todo o tempo, porque os tempos são outros.
Para mim, a melhor parte vai até o fim do Aborto Elétrico, mais ou menos. Gosto daquele sul-africano. Gosto bem dessa parte (embora haja talvez um excesso de garrafas quebradas…).
Quando entra nas dúvidas existenciais do RR, o que eu quero da vida, o que eu quero da música, Legião Urbana e tal me parece menos interessante, aquela coisa mais convencional, quase Turma da Praia, e não digo isso no mau sentido, não: o filme preserva certo encanto, mas é um encanto meio industrial, aquela coisa um tanto programada, mas não falsa propriamente…
Não sei se me exprimo bem, mas vamos lá.
Não por acaso o filme vai acabar lá tipo 2 Filhos de Francisco, com o sucesso de certa forma funcionando como prova dos nove, coisa bem Velha Hollywood, bem séc. XXI paulistocarioca. O sucesso redime. Uma concessão.
Mas, enfim, o filme faz sucesso… Que bom: um sucesso merecido… Oportunista no bom sentido. Como o cinema deve ser.
Não alienado, quero dizer. Não é cinema alienado. Porque esses filmes de músico são em geral alienados, mesmo o dos Gonzaga, com seu fotografismo, no fundo não tem nada a dizer.
“Somos Tão Jovens” tem.
Agora, é preciso dizer que os personagens dos pais são quase sempre lamentáveis.
Caramba, o cara era economista do BB, mas se comporta como o cara que serve cafezinho. Não é que finge não entender nada por causa do emprego, essas coisas… É que parece bobo mesmo.
Aliás, o apartamento onde vivem é bem à altura disso. Uma cenografia horrorosa. Aquela parece verde… Aquela toalhinha em cima da TV… Onde foram achar essas coisas?
Mas isso são detalhes. O filme tem vigor, parece filme de cara novo. O filme de muitos caras novos é que parecem encarquilhados, atualmente.
O filme entrou, leio na Rosário, com uns 450 mil espectadores. É um contraponto aos “filmes de público”, ao facilitário geral que anda por aí disfarçado de cinema.