A Academia elege o academismo
Inácio Araújo
1. A escolha de “O Discurso do Rei” como melhor filme e direção, além de ator e roteiro (adaptado ou original? não lembro mais) sugere uma dessas escolhas de cautela.
Sem um filme pelo qual se apaixonar, os eleitores optaram por esse que não faz mal a ninguém, é correto, se funda sobre um show de atores admirável, não corre nenhum risco, não ofende a ninguém e ainda tem como pano de fundo a vida (ou os problemas) de um rei pouco conhecido.
2. Aproveita-se de passagem para exaltar a monarquia, seu papel para o Reino Unido e, vamos lá, para o mundo durante a Segunda Guerra. Há um bom exagero nisso.
Em suma, o típico cinema do papai.
3. Qualquer pessoa que tenha visto “A Rainha” dificilmente dirá que este filme não concorre em qualquer aspecto (salvo atores: lá está pau a pau) com o de Stephen Frears.
Mas é assim: de tempos em tempos o Oscar se sente na obrigação de dar uma força à Inglaterra, o país que mais sofre com a concorrência de Hollywood.
5. O Oscar, que já foi o prêmio aos melhores filmes do ano, tornou-se há algum tempo prêmio aos melhores filmes do Oscar. Ganha, em geral, quem chega na última hora. Sem chance para “A Rede Social” (gosto) ou “A Origem” (não gosto) e, claro, “Toy Story 3”.
6. Para resumir: que coisa sem graça! Parece que a cerimônia vai ficando pior a cada ano, ou talvez seja eu que vou ficando mais velho a cada ano. De todo modo, os dois fenômenos são cada vez menos agradáveis.
7. Só como registro (valerá a pena notar): Bloomberg detectou a presença de Saadi Khadafi na produção cinematográfica dos EUA. O investimento anunciado em 2010 era coisa de US$ 100 milhões. Situação embaraçosa, em face das circunstâncias atuais, mas que teria passado em branco se houvesse calmaria no Oriente Médio. Fala também um tanto sobre as fontes de financiamento do cinema dos EUA, aquele que não precisa de financiamento do Estado. Não do seu Estado, em todo caso.
8. Só como adendo: Khadafi, o pai (assim como o filho) adora cinema. Escreveu um roteiro chamado “Anos de Tormento”, sobre a invasão da Líbia pela Itália em 1911. Não encontrou elenco que topasse.
9. Verdade seja dita, segundo “Les Inrocks” Randon House havia se recusado a produzir com Saadi. O parceiro dele é (ou era) Natural Selections.
10. Bem discretamente morreu Annie Girardot, atriz, entre tantos outros, de “Rocco e Seus Irmãos”. Durante anos a gente até enjoava de vê-la nos filmes franceses. Dava a impressão de que era a única atriz por lá. Mas a partir de um momento desapareceu e se começou a sentir falta de sua presença segura, elegante, marcante, embora discreta. Não era tanto de brilhar, mas era muito eficaz..