O Dia do Contador
Inácio Araújo
Quer dizer: com toda franqueza não sei se existe esse dia.
Mas acho que é hoje, depois que acaba a entrega do Imposto de Renda.
Então, minha homenagem aos esforços para que eu pague mais imposto é a revisão do “Simonal –Ninguém Sabe o Duro que Dei”.
O contador é a figura.
Depois de um baita esforço do filme para demonstrar, por um acúmulo de autoridades, opiniões, testemunhos, que Wilson Simonal foi antes de tudo um cara perseguido porque era negro e bem-sucedido, os realizadores do filme acharam ele: O Contador.
O contador que, quando se viu na falência, o Simonal contatou uns amigos que trabalhavam no Dops para dar o que se chamava, talvez ainda se chame hoje, uma coça.
Bem, quem não quis, uma dia na vida (ou mais de um) bater no seu contador? Atire a primeira pedra. Eles levam a culpa pelos impostos que a gente tem de pagar.
Pois o Simonal passou ao ato.
Será tão horrível assim ter amigos no Dops?
Eu não teria. Mas acho que um cantor, bem, é fácil, os caras chegam, eles querem ser amigos do sujeito famoso, se encontram no bar…
O fato é que deu tudo errado. Os cretinos do Dops levaram o contador para as masmorras e o torturaram horrivelmente, até que confessasse tudo o que alguém pode confessar.
Entrementes, a mulher do contador, sabendo o seu sumiço, foi à Delegacia, dar parte do desaparecimento do homem. E, claro, entre as duas instâncias, mobilizadas ao mesmo tempo, deu o maior bode.
O contador conta tudo no filme.
Acho que foi honesto da parte dos realizadores do filme inserir esse “outro lado”.
O problema é que ele destrói o filme. Tudo vem armado para demonstrar que o Simonal era um bom sujeito, simpático, bom cantor, controlava a platéia, vendia disco, etc. etc. etc.
Aí aparece o contador e fica tudo manchado, muito feio mesmo.
A verdade é que o Simonal não foi execrado por isso, mas por ser, supostamente, delator a serviço do Dops ou algo assim.
E isso deve ter sido algo cultivado pelo Pasquim, cujos representantes no filme tiram o corpo fora, se eu bem entendi, e jogam a culpa no tempo atribulado.
Não sei. Seria mais honesto assumir que a partir de um boato se construiu um fato que arrasou de fato com a vida do Simonal, cuja irreponsabilidade, no mais, o filme demonstra em último grau.
Dito isso, o filme serviu mesmo foi para limpar o contador.
Então viva o Contador, esse ser que me esfola todo mês.